Povo Tembé Tenetehara comemora hoje Dia do Índio
Em Ourém do Pará – o município homónimo de Ourém, de Portugal – habita o povo tembé, indígenas brasileiros que constituem um subgrupo dos tenetearas. Este povo comemora hoje o seu dia com tradicionais festejos.
Os índios tembé encontram-se fixados no nordeste do Pará, nas reservas indígenas do Alto Rio Guamá onde se situa o município de Ourém e Turé-Mariquita; no noroeste do Maranhão e no Estado de Minas Gerais, respetivamente nas áreas indígenas do Alto Turiaçu e em Luísa do Vale. As fotos são de Arlindo Matos, animador cultural e proprietário da Eco-Pousada Luar Lindo.
Histórico do contato
Em meados do século XIX, uma parte dos Tenetehara dos rios Pindaré e Caru, no Maranhão, rumaram na direção do Pará, para os rios Gurupi, Guamá e Capim, dando origem aos hoje conhecidos como Tembé (deixando no Maranhão os Guajajara). Nesses rios, ficaram sob o novo regime indigenista que acabara de ser criado, em 1845, em que cada província tinha um diretor geral (não havia um órgão indigenista encarregado de todos os índios do Império), sob cuja jurisdição ficavam os diretores de aldeia. Engajaram-se então na extração do óleo de copaíba, que era negociado com os regatões (comerciantes que percorrem os rios de barco) conforme o sistema de aviamento, isto é, de adiantamento de mercadorias a serem pagas com produtos florestais. Os regatões também se valiam dos índios para a busca de ouro, borracha, madeira de lei e como remeiros. Na extração do óleo de copaíba, a unidade de produção era a família extensa. A extração se fazia na mata, acima do nível anual de inundação, em árvores que eram poucas e dispersas, que não podiam ser sangradas na estação seguinte, o que provocava uma constante necessidade de deslocamento das famílias extensas para novas áreas ainda não exploradas. As aldeias Tembé, conseqüentemente, ou eram pequenas com localização mais ou menos permanente, ou temporariamente grandes com forte tendência à cisão.
Os abusos e extorsões dos regatões provocaram um conflito em 1861, no alto Gurupi, em que sete Tembé mataram nove regionais. O policial encarregado de apurar os fatos espancou os índios e lhes tomou nove crianças, remetidas a Vizeu. Os índios fugiram e abandonaram sua aldeia. O governo provincial retirou os regatões da área e reuniu os moradores dispersos da aldeia de Trocateua na nova aldeia de Santa Leopoldina. Em 1862, só no alto Gurupi, havia 16 aldeamentos e, no último decênio do século XIX, havia notícia de numerosos grupos Tembé não contatados.
A assistência aos Tembé do Gurupi por parte do SPI parece ter sido conseqüência da atividade de atração dos Ka'apor. Entre 1911 e 1929 o SPI criou três postos de atração. Em 1911, instalou o posto Felipe Camarão, junto à foz do Jararaca, afluente da margem direita do Gurupi. Parte dos Tembé do alto curso deste rio desceram para viver junto ao posto e trabalhar como intermediários na atração dos Ka'apor. Por falta de recursos, a atividade do posto cessou em 1915, embora ele só tenha sido extinto em 1950. Entre 1927 e 1929, o SPI criou mais dois postos. O Posto Pedro Dantas foi instalado na ilha Canindé-Açu, próxima ao local onde os Ka'apor costumavam atravessar o Gurupi; e o Posto General Rondon, no rio Maracassumé. Este último foi fechado em 1940, enquanto o Pedro Dantas, onde finalmente foram contatados os Ka'apor em 1928, tornou-se o atual PI Canindé. Com a instalação dos postos do SPI, os Tembé foram paulatinamente abandonando as cabeceiras do Gurupi e se instalando no curso médio do mesmo rio. Serviram ao SPI como guias, remeiros, trabalhadores nas roças e na fabricação de farinha. Mas o SPI também favoreceu na década de 50 a entrada de regionais para trabalhar nas roças do posto. A falta de cidades próximas e a dificuldade de escoamento da produção agrícola levaram o SPI a estimular o comércio dos índios com os regatões, aos quais forneciam couros de onça, enormes quantidades de jabutis, de aves e resinas diversas.
Na década de 70, já no tempo da Funai, boa parte dos homens Tembé do Gurupi em idade adulta foram levados a trabalhar na Transamazônica, em frentes de atração de outros grupos Tupi, como os Parakanã e os Asurini do médio Xingu, desfalcando as aldeias de elementos masculinos, provocando escassez de alimentos com base na carne e no peixe e um esvaziamento das práticas rituais. Em 1971, a Funai ordenou a transferência dos Tembé do Gurupi para o rio Guamá, mas eles se recusaram a migrar.
Quanto aos Tembé do rio Guamá, eles permaneceram sob a exploração dos regatões, dedicando-se sobretudo ao corte de madeiras. Em 1945, quando já mantinham intensos contatos com os civilizados, o SPI instalou o primeiro e único posto na região. O posto operou num regime de produção para venda e para o próprio consumo, engajando os índios nos serviços de lavoura, e também na abertura de uma estrada, nunca concluída, que deveria ligar o Guamá ao Gurupi. Uma cantina fornecia gêneros alimentícios, roupas e ferramentas aos índios, descontando-lhes as despesas na folha de pagamentos. Por volta de 1960, um chefe de posto, para aumentar a produção, facilitou a entrada de colonos oriundos de uma frente camponesa que alcançava a região, o que trouxe uma intensificação dos casamentos interétnicos e do uso da língua portuguesa. Esse regime durou até a extinção do SPI em 1967. Paralelamente às tarefas promovidas pelo posto, os índios extraíam e comercializavam madeira por conta própria, descendo com jangadas de toras até Ourém. Por outro lado, a presença de caçadores de peles, madeireiros e criação de gado fez decair a caça e a pesca.
Em 1970, o posto já não mantinha nenhum dos antigos projetos e estava abandonado, o que levou os Tembé a voltarem a plantar suas próprias roças numa área bastante desmatada. A Terra Indígena foi invadida por empresários, fazendeiros e posseiros. Houve várias negociações para retirada dos invasores, mas todas frustradas. Em 1978, a Funai propôs o loteamento de parte da Terra Indígena para os posseiros. Auxiliados pelo Conselho Indigenista Missionário (CIMI), da Igreja Católica, os Tembé do rio Guamá fizeram uma reunião com os do Gurupi em 1983, quando fizeram um abaixo-assinado contra a redução da Terra Indígena. Simultaneamente, foram convidados pela Funai a mudarem-se para o Gurupi. Alguns migraram, mas parte deles retornou depois de serem atacados pela malária e o sarampo.
Fotos: Arlindo Matos
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